segunda-feira, 15 de novembro de 2010

"Teologizar é preciso, viver não é preciso".














Conselho a um Jovem Teólogo
Dirijo-me a você, caro jovem, você que está começando o estudo da teologia. Para mim, você representa a teologia do futuro, de modo que, dirigindo-me a você, é como se eu falasse ao teólogo do III Milênio, que está às portas. Quero dirigir-me também a quem, mesmo não sendo jovem de idade, se interessa pelas coisas da fé, ainda que de modo informal.
Antes de começar, quero que você esteja bem convencido da importância e mesmo da necessidade de estudar teologia. Teria aqui vontade de parafrasear a famosa frase de Pompeu (Navegar é preciso, viver não é preciso) e que se tornou em seguida o lema dos grandes navegantes: "Teologizar é preciso, viver não é preciso". Não quero dizer com isso que a vida é para a teologia (o contrário é que é verdade), mas apenas enfatizar que vale a pena gastar os dias a aprofundar o mistério de Deus, o que não deixa, aliás, de redundar em benefício próprio e de todo o povo.
É a muitos títulos que a teologia é necessária. Vejo pelo menos cinco instâncias diferentes que solicitam o estudo da teologia: a fé, o mundo, a vida, a época de hoje e a realidade social.
1. A fé pede teologia. É, em primeiro lugar, a própria fé que, por sua dinâmica interna, busca compreender o que crê. Todo "crente" verdadeiro é também, e a seu modo, um "teólogo". Pois, a teologia é precisamente "a fé que deseja entender", como a definiu magistralmente Anselmo. Sem o estudo, a fé facilmente cai na cegueira do irracionalismo e da superstição, ou na miopia da superficialidade e do sincretismo.
2. O mundo que existe pede teologia. A própria criação é um grito inarticulado por um Criador. A teologia nada mais faz senão recolher esse grito e articulá-Io racionalmente. E se você incluir na idéia de mundo o curso histórico, inclusive os eventos da Revelação, então a razão é interpelada no máximo de sua potência. Ela, que se interroga sobre tudo, não pode se esquivar de perguntas como:
Que querem nos dizer os "enviados de Deus", especialmente Jesus de Nazaré?
3. A vida pede teologia. Nós, os viventes, buscamos inelutavelmente o sentido último e radical das coisas. Por que a existência, a dor, a culpa, a morte?
Como responder adequadamente a essas questões fundamentais e perenes sem recorrer a alguma teologia?
4. Nossa época pede teologia. A cultura moderna é essencialmente reflexiva: não se contenta apenas com o recurso à tradição, mas pergunta sempre pelo porquê de tudo. Mesmo a chamada razão pós-moderna, embora prefira o "discurso fraco", ela também precisa ser submetida a discernimento. Mais: as questões atuais com que a fé se vê confrontada são tão complexas que exigem reflexão elaborada e rigorosa. Pense somente nas questões que põe hoje a economia (neoliberalismo, mercado, globalização, tecnologia, etc.); ou as que colocam as ciências modernas, como a biologia (clonagem, inseminação e gestação humanas em meios artificiais), a cosmologia (origem e fim do cosmos, leis constitutivas do universo, a hipótese de outros mundos habitados, etc.), a ecologia e poderíamos continuar.
5. A realidade social em que vivemos pede teologia. Qual é a missão dos cristãos frente aos grandes desafios sociais de hoje?
Para confrontar seriamente a fé com esses desafios é preciso botar a razão teológica para funcionar. Sobretudo nós, no Sul do mundo, queremos saber como a fé pode ser fermento de libertação para a massa de excluídos do sistema social. Agora, se você incluir na realidade social a cultura, então surgem outras perguntas, tipicamente teológicas, como: Que sinais de Deus estão presentes nessa ou naquela cultura?
Como inculturar aí as linguagens e as práticas cristãs?
Bem, meu caro amigo, parece-me que ficou claro porque é necessário e mesmo urgente fazer hoje teologia.

Trechos do livro Teoria do Método Teológico de - Clodovis Boff

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